ESN: 16675-080201-838850-87
Guest Post de Gabriel Meissner do Blog Entremundos
Ser vereador e deputado não é tarefa fácil. Entre as suas atribuições estão fiscalizar as ações e contas do poder executivo que, digamos, freqüentemente exerce suas funções de maneira antiética ou mesmo ilícita. E tão importante quanto a fiscalização é legislar sobre assuntos do interesse da sua cidade apresentando projetos de lei relevantes para a população que o elegeu. Mas legislar não é tão fácil quanto fazer promessas de campanha. Uma coisa é fazer declarações generalistas como: "se eleito vou defender os direitos das mulheres". Mas, outra é criar e aprovar leis específicas que efetivamente o cumpram seu propósito – como a Lei Maria da Penha. Uma declaração generalista é apenas uma intenção. Mas entre a intenção e a ação existe uma grande distância (Sem mencionar o fato de que de boas intenções o inferno está cheio).
Para dificultar ainda mais, não basta apenas ter uma boa idéia que realmente fará a diferença. É preciso apresentá-la em um projeto de lei, que segue moldes muito específicos e técnicos, os quais a grande maioria dos parlamentares eleitos não domina. Daí a necessidade de assessores que saibam executar este trabalho.
Não é novidade para ninguém que um número mais do que expressivo dos parlamentares brasileiros se engajam na carreira política sem nenhuma vocação para tal. Alguns por inocência, por desejarem fazer algo pelo seu país, mas sem terem idéia da complexidade do trabalho parlamentar. Outros – infelizmente mais numerosos que o primeiro grupo – por má fé; por desejarem ganhar (bem) sem trabalhar e para garantir oportunidades de fazer as suas “maracutaias”.
Não é à toa, portanto, que vemos tantos parlamentares apresentando projetos de lei desnecessários, irracionais ou mesmo ridículos. Já é fato bem conhecido nas Câmaras de Vereadores de qualquer cidade que os projetos de lei mais numerosos propõem a mudança de nomes de ruas; parques e outros logradouros públicos. O que, além de não trazer nenhum benefício real à população, impõem gastos públicos com a mudança de placas: alterações de mapas oficiais; etc.. À título de ilustração, recentemente o jornal O Estado de São Paulo publicou uma matéria revelando que apenas 5% das leis dos deputados estaduais de SP têm relevância para os cidadãos.
Um exemplo é o ex-vereador de São Paulo – Agnaldo Timóteo (PP) – que propôs a mudança do nome do Parque Ibirapuera para Parque Michael Jackson. Não é de se espantar que, em sua candidatura a deputado federal na última eleição, ele tenha se proposto a "continuar o trabalho do Clodovil, que não podemos deixar morrer". Certo, mas QUE trabalho?
Este não é um caso isolado. Muitos outros projetos “sem pé nem cabeça” são apresentados cotidianamente nas Câmaras de Vereadores e Deputados país afora. Outro exemplo é o do vereador Juscelino Gadelha (PSDB) que pretendia "tombar" o sotaque italiano do bairro da Mooca. Como ele pretendia fazer isso, ninguém sabe. O que isso traria de bom à população, muito menos.
Sem mencionar a criação de datas e mais datas comemorativas sem a menor relevância, tais como o "Dia da Esposa do Pastor Evangélico", "Dia da Baiana do Acarajé", "Dia Nacional do Macarrão" e "Dia Nacional do Estresse". Neste último, provavelmente, toda a população seria incentivada a gritar e brigar com conhecidos e desconhecidos nas ruas, no trabalho e em casa por motivos banais…
Enquanto os dois projetos mencionados acima são uma piada com a cara do eleitor e foram propostos apenas para os “nobres parlamentares” afirmarem que apresentaram "X" projetos em seus mandatos. Há outros que são até bem intencionados, mas que escancaram o fato de que seus proponentes simplesmente não entendem como o mundo funciona. Por exemplo, todo mundo sabe que o aparente anonimato na Internet cria uma série de situações complicadas: Indivíduos mal intencionados cometem atos de discriminação, cyber-bullying, ameaçam e difamam com a esperança de não serem descobertos e, sem falar nos casos de pedofilia, roubos de informações etc. Muito se tem discutido sobre como prevenir esses crimes sem tirar do acesso à Internet a liberdade que lhe é característica.
Entretanto, como o assunto é complexo (e alguns parlamentares nada entendem do mundo digital) várias propostas absurdas já surgiram: O projeto de lei 5185/2009, do deputado Fábio Faria (PMN-RN) pretendia criar um cadastramento obrigatório para acesso à rede mundial de computadores. O “detalhe” desta PL está no fato de que, ao contratarmos um provedor, todos já fazemos um cadastro. Além disso, já existe o endereço IP que identifica o computador durante o seu acesso a Internet – tornando o projeto totalmente desnecessário e redundante.
O deputado Fábio Faria até pode ter criado o projeto com boas intenções. Mas, obviamente, não tinha o conhecimento para legislar sobre o tema e nem se preocupou em obtê-lo (como seria o esperado).
Novamente, casos como esse não são isolados. E projetos de lei criados sem conhecimento de causa abundam no Brasil. As Câmaras precisam perder tempo discutindo e votando cada um deles. Tornando o processo político (ainda mais) moroso. Afinal, enquanto eles criam, discutem e votam esses projetos sem sentido, nós pagamos os altos custos e salários envolvidos no processo.
Mas, como toda dificuldade também cria uma oportunidade; há quem se aproveite da falta de bom-senso, conhecimento técnico e/ou vontade de trabalhar dos “nossos representantes” para lucrar com isso. Como o ex-vereador José Gilberto de Souza (PSDB), criador do site Projetos de Lei – que vende projetos “prontos para usar” sobre qualquer assunto. É tão simples de usar quanto o serviço delivery da sua pizzaria predileta. E dispõe de mais opções e sabores.
O site existe desde 2010 – ano em que não conseguiu se reeleger vereador – e foi criado “para não desperdiçar a sua vocação política”. Assim, decidiu auxiliar outros vereadores a criarem os seus próprios projetos genéricos. O processo é simples: o cliente entra no site; escolhe o tema sobre o qual pretende legislar e se depara com uma infindável lista de projetos prontos para comprar. Como os projetos são genéricos; servem bem para qualquer tendência política – bastam pequenas adaptações no texto, o que é bem mais simples do que criar o projeto desde o zero. Não exige esforço de raciocínio ou de pesquisa (muito menos vergonha na cara e consideração com o eleitor).
Vamos imaginar que você fosse um vereador e fez várias promessas de campanha ligadas ao meio ambiente. Agora, não quer desapontar o seu eleitorado. Ao invés de pesquisar sobre os desafios ligados a sustentabilidade no seu município; é muito mais fácil acessar o site de José Gilberto de Souza, escolher um dos 67 projetos prontos sobre o assunto; pagar por eles e apresentar na Câmara a intervalos regulares; mostrando à população como você é um vereador honesto e trabalhador (e apresentou "X" projetos durante a sua gestão). Parece piada, mas faz 11 anos que este site atende a "clientes" de todo o país.
Comecei este artigo dizendo que ser vereador ou deputado não é tarefa fácil. Agora sou obrigado a dizer que "não deveria" sê-lo. Mas infelizmente se torna simples, quando vemos que para toda dificuldade legítima uma facilidade picareta é rapidamente criada. Como disse, já faz 11 anos que o site “Projetos de Lei” existe. Em todo esse tempo não houve nada que o Ministério Público pudesse fazer para determinar que fosse fechado pela sua atividade antiética (porém “legal” ao explorar uma brecha na legislação). Além de fechado, o seu criador deveria ser obrigado a entregar a lista de clientes – os quais deveriam ser processados e obrigados a deixar os seus cargos – Infelizmente, não há nenhuma esperança de que isso ocorra.
Essa é a realidade brasileira. Mas acho que isso não é novidade para você.
Ou é?
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Fontes consultadas:
Revista Galileu: Os piores projetos de lei sobre Internet no Brasil
Conteúdo.com.br: Projetos ridículos apresentados
Alfarrábio: Não tem projeto? Compre pela Internet!
O Estado De São Paulo: Só 5% das leis dos deputados estaduais de SP têm relevância para o cidadão
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SER PARLAMENTAR NO BRASIL É MUITO FÁCIL.