A VISÃO POLÍTICA DA BLOGOSFERA – NOSPHERATT – BLOSQUE.

ESN: 16675-080201-838850-87

 

Entrevista Panorâmica - Nospheratt - Blosque

 

 

A blogueira entrevistada de hoje é a Nospheratt, editora do Blosque. Uma brasileira que vive no Uruguay (tenho que escrever com “Y” mesmo, se não ela me mata) há treze anos e tem uma visão distanciada das influências ideológicas que podem poluir as opiniões de blogueiros favoráveis a uma ou outra corrente política nacional. Exatamente por isso, fiz questão de entrevistá-la como forma de trazer uma “visão de fora” em relação às questões de nossa política e do aparente viés autoritário que nos ameaça.

Também não há ninguém melhor do que ela para opinar sobre a blogosfera, pois sua luta pela construção de uma mentalidade profissional e eticamente responsável nos blogueiros iniciantes é famosa. Se você comparece a eventos ou acompanha notícias ligadas a blogosfera, certamente já ouviu falar dela. Bem ou mal, isso é irrelevante para alguém que tem enormes serviços prestados ao mudo dos blogs e é uma escritora talentosa, irreverente, inteligente e extremamente mordaz. Se não a conhece, tem agora a oportunidade de um pequeno vislumbre do que vai por sua mente inquieta e sempre em busca de um novo projeto.

Leiam e comentem.

 

blosque

 

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A Visão Política da Blogosfera - Nospheratt - Blosque

 

Visão Panorâmica – Você mora fora do Brasil há 13 anos. Qual é a visão que a mídia e o povo têm, do Brasil e do brasileiro, no país onde você reside atualmente?

Nospheratt – Eu moro no Uruguay (com y, porque escrever Uruguai é como escrever Brazil, eu detesto). Não acompanho muito noticiários, jornais, esse tipo de coisa; mas o que eu vejo na mídia são apenas notícias, não coisas de opinião sobre o país.

Já o povo adora brasileiros. Basta você falar português na rua, e as pessoas acham que podem falar com você, porque brasileiro é simpático (na visão deles). É comum que ao me ouvirem falar português (no supermercado, nas lojas, na rua) desconhecidos me cumprimentem e tentem me ajudar, se acham que preciso de ajuda (embora não entendam uma palavra do que estou dizendo).

Por exemplo: um dia eu estava à noite perto de uma zona não muito recomendável para turistas, com uma amiga brasileira que veio me visitar. Estávamos olhando uma vitrine, e é claro que eu sei perfeitamente onde se pode ir ou não. Um senhor de idade nos ouviu, se aproximou, e nos disse em um portunhol bem enrolado que não fôssemos para esse lado, pois é perigoso. Claro que eu não tive coragem de dizer para ele que na verdade eu moro aqui e falo espanhol, só agradeci. :)

Ele não tinha porque nos informar de nada, mas isso resume bem a atitude que os uruguayos têm com os brasileiros.

Sobre o país em si, a visão deles (do povo) é um pouco distorcida como deve ser, aliás, toda visão das pessoas sobre países que não conhece. Muita gente aqui acha que no Brasil só tem negros e índios, e que o Brasil é samba, futebol e carnaval. Há muito mais conhecimento sobre a Argentina, por causa da barreira do idioma.

 

porões a nova ditadura

 

Visão Panorâmica – Você sempre foi muito ligada à orientação e ao fomento das boas práticas na blogosfera. Baseado nessa vivência, como você tem percebido a evolução da blogosfera brasileira durante a sua militância?

Nospheratt – Infelizmente, não vejo evolução, mas involução. Estou na blogosfera desde 2006 (o que em anos de blog equivalem a uns 40 anos :P ), e o que era ruim nessa época só fica pior. Não é questão de "todo tempo passado foi melhor"; acontece que os blogs se popularizaram de lá para cá, e quanto mais gente há em um espaço, mais os defeitos inerentes ao ser humano se evidenciam.

Isso significa que mais blogs = mais merda na blogosfera. Claro que também aumenta o número de bons blogs e blogueiros decentes, mas estamos perdendo feio essa corrida.

Só pra ilustrar, dois exemplos:

1 – No final de Agosto, a Juliana do Dicas Blogger encontrou mais um plágio de seu blog (o que infelizmente não é nenhuma novidade). A novidade é que o infeliz tinha plagiado não só mais de 400 posts do Dicas Blogger, como tinha publicado mais de 5.000 (sim, cinco mil) posts em menos de um mês de existência. Óbvio que isso só é possível roubando conteúdo alheio.

O plágio não é coisa nova, mas está cada vez pior e mais estendido.

2 – Muitos excelentes blogueiros estão cogitando com frequência sobre fechar os comentários de seus blogs. Por que? Porque o nível dos comentários é baixíssimo, geralmente escrito em língua incompreensível (já não é nem miguxês), e o nível de agressividade é absurdo. Insultos e palavrões abundam.

Para completar, quem mais sofre com isso são os metablogs, isto é, os blogs que ensinam a blogar. Quem lê esses blogs? Outros blogueiros. O que isso diz sobre a evolução da blogosfera?

 

 

Visão Panorâmica – É crescente na América Latina a intenção (declarada ou não) de estabelecer-se o controle de todas as fontes de informação pelos governos. Como você analisa essa questão em relação ao blogs e qual seria uma forma eficaz de combater esse avanço do autoritarismo sobre a liberdade de expressão?

Nospheratt – Pela própria natureza dos blogs, eles vão ser cada vez mais visados nesse quesito – pelo fato de que qualquer um pode ter um blog e publicar o que quiser. Isso faz deles um alvo enorme para quem quer controlar informação e opiniões. As tentativas de silenciar blogs ainda são relativamente poucas, mas quanto mais os blogs crescem, mais ataques desse tipo sofrerão.

E justamente o que faz com que eles sejam tão visados, é a sua maior fortaleza contra as tentativas de controle da informação. Depois que uma coisa é jogada na rede por um blog, é praticamente impossível fazer com que a informação desapareça, pois ela reverbera em mil lugares diferentes.

Para combater o avanço desse autoritarismo, é importante que os blogueiros não se deixem intimidar. Não é coisa fácil, mas estamos numa rede, e devemos usar essa rede. Tentativas de abuso de autoridade devem ser anunciadas aos quatro ventos, quem sofrer pressão precisa pedir apoio de leitores e de outros blogueiros. Precisamos colocar a boca no trombone porque, se ficarmos em silêncio, teremos perdido a batalha.

Lembrando que os abusos não vêm só dos governos – há cada vez mais casos de empresas e profissionais independentes que atacam blogs que publicam opiniões negativas sobre seus serviços. Isso é inaceitável; se faz necessária a criação de uma cultura que mostre que não adianta calar um blog, porque muitos outros virão apoiá-lo.

 

A farsa do pac

 

Visão Panorâmica – A questão do combate ao plágio na blogosfera sempre foi um ponto de honra e de luta para você. Muitos aborrecimentos e algumas conquistas. Você percebeu algum progresso nessa área? Qual a opção mais acertada para proteger, o blogueiro que cria, dessa verdadeira praga?

Nospheratt – Infelizmente, não há forma de se proteger. Como eu comentei acima, o plágio está cada vez pior, e não há forma de efetivamente evitá-lo. Não há plugin nem bloqueio que impeça quem quer copiar, de copiar.

É recomendável deixar claro, em lugar visível no blog (não só no rodapé), qual é a licença de conteúdo que você usa. Isso não resolve muito, mas desencoraja quem não for um completo FDP, quem copia por ignorância. Só que para o plagiador contumaz, aquele que sabe que está fazendo errado e não liga, a licença não faz diferença nenhuma. Eu tenho um aviso de que é proibido copiar meus textos, bem destacado, no final de TODOS os meus posts. E mesmo assim muita gente vai lá e rouba meu conteúdo.

No entanto, a batalha não está perdida. Há uma única coisa que podemos fazer, que pode funcionar: evangelizar. Ensinar aos leitores e visitantes que plagiar é errado, explicando porque.

É um trabalho de formiga, uma solução a “looongo” prazo, mas é a única saída. Quanto mais gente estiver fazendo isso, ensinando que plagiar é errado, mais se diluirão as idéias do tipo "Se está na Internet, se pode copiar", "Plágio é homenagem" e outras parecidas.

E eu falo por experiência. De vez em quando recebo comentários no Blosque de pessoas que confessam que eram plagiadores, mas que depois de ler meus textos sobre o assunto entenderam que estavam fazendo algo muito errado. E essas pessoas param de plagiar. Há casos em que o blogueiro deleta todos os “trocentos” posts plagiados que tinha publicado.

Se CADA blog que existe se preocupar com ensinar seus próprios leitores, sejam muitos ou poucos, o problema do plágio diminuirá consideravelmente. Nunca desaparecerá completamente, porque o ser humano é falho e dado a fazer merdas, mas sem dúvida haverá uma melhora – em longo prazo.

Essa é a única solução possível.

 

 

Visão Panorâmica – Em sua opinião, como a blogosfera política brasileira pode criar mais relevância, aumentar a sua penetração e criar uma cultura de interesse político no público?

Nospheratt – Falando as coisas de forma mais clara e digerível. A maioria das pessoas (eu incluída) não entende quase nada de política. É preciso ensinar o bê-a-bá, explicar porque as coisas das quais se falam no blog são importantes, como elas afetam na prática a vida do leitor.

Porque pouca gente se interessa por coisas abstratas como "dever cívico", "cidadania", "democracia" e coisas assim; mas todo mundo se interessa pelos impostos que tem que pagar, pelo preço do pão, a escola dos filhos e a segurança nas ruas. É preciso ensinar como a política influi nessas coisas, e qual é o poder que o cidadão tem sobre isso.

Também acho importante propor formas práticas para que o público participe do debate e exerça a cidadania. A imensa maioria da população pensa que a única coisa que pode fazer é votar quando há eleições, e o faz por obrigação. A blogosfera política é um excelente meio para conscientizar as pessoas de que há muito mais do que isso que pode ser feito.

Isso também é um trabalho de formiga, mas não existe alternativa possível a não ser jogar a toalha.

 

Brasil, um país de todos

 

Visão Panorâmica – Você está inteirada sobre o Movimento dos Blogueiros Progressistas? O que acha dele?

Nospheratt – Sim, estou inteirada de sua existência. Sei bem pouca coisa sobre esse movimento, pois senti rechaço e me desinteressei ao ler as primeiras linhas do "manifesto" deles. Diz lá: "Se reuniram em São Paulo para materializar uma entidade, inicialmente abstrata, dita blogosfera". Essa proposição é tão absurda que não sei por onde começar. Primeiro que a blogosfera não é abstrata, nem uma coisa que possa ser "materializada"; esse termo nada mais é do que como nos referimos ao conjunto de blogs que existem. Esse conjunto conta com milhões de blogs, é uma massa gigantesca e heterogênea.

Segundo; quem são essas pessoas que se arvoraram o direito de falar em nome da blogosfera? Se eles querem se reunir e criar um movimento ou entidade ou seja lá o que for, estão no seu direito; mas ninguém tem como falar em nome da "entidade blogosfera" como um todo, justamente por causa do tamanho e da heterogeneidade dela.

Não há leis nem democracia na blogosfera; ela é anárquica por natureza, e é daí que advém seu crescimento. Isso significa que não há como eleger representantes que possam realmente falar em nome dela. Eu acho que não dá para levar a sério um grupo de blogueiros que pretende falar em nome de todos os outros, sem consultá-los.

 

 

Visão Panorâmica – O aumento de blogs patrocinados por partidos políticos, mas que não assumem isso publicamente, pode representar algum tipo de ameaça aos blogs levados com seriedade – por conterem matérias questionáveis sobre uma ou outra vertente política de determinada localidade – e acabarem destruindo a confiabilidade que alguns blogs, geridos com uma visão supra-ideológica, alcançaram junto ao público?

Nospheratt – Não creio. Um blog que seja honesto com seus leitores (seja lá qual for o assunto do qual trata) e que tenha construído uma relação de confiança com eles, não perderá essa confiança porque existem outros blogs que não são transparentes e honestos.

Claro que a chave da questão é a construção dessa imagem de transparência, é conquistar a confiança do leitor. Mas uma vez que essa relação é construída, a única pessoa que pode destruí-la é o próprio blogueiro. Pois embora existam hordas de imbecis e analfabetos funcionais vagando pela Internet, o leitor de blog é bem mais inteligente do que os blogueiros pensam.

Se você é capaz de se diferenciar claramente dos blogs desonestos e tendenciosos, e mantém a qualidade do seu trabalho, o leitor o seguirá onde for.

 

Vazamentos da Receita

 

Visão Panorâmica – Como a blogosfera latino-americana pode se firmar como fonte de um pensamento cívico crítico e livre, além de adquirir relevância para o debate político em nossos países?

Nospheratt – Abandonando as picuinhas partidárias. O que é certo e errado independe do partido de quem protagoniza os acontecimentos. A mania de trocar farpas, acusações e ofensas só é interessante para quem gosta de participar disso – a maioria do povo não gosta. A virulência com a qual a política é tratada por quem está envolvido nela é extremamente chata, difícil de engolir. A sensação que fica é que o único objetivo é enxovalhar o adversário, e que o "pensamento cívico crítico e livre" não existe.

A forma como se ataca o partido contrário e se defende o próprio lembra muito as torcidas fanáticas de futebol. Não dá para levar a sério. O nível do debate tem que ser outro.

Além disso, como eu disse lá em cima, compartilhando informação relevante, atendo-se aos fatos, ensinando o bê-a-bá e usando linguagem simples de entender. Se você quer que a dona Maria e o seu João acompanhem o seu blog e se interessem pelo debate político, é necessário falar de uma forma que eles entendam.

 

 

Visão Panorâmica – Como vencer o paradigma do "Pão e Circo" na blogosfera? (Ao dizer "Pão e Circo", falo em referência a preferência clara dos leitores para os blogs de fofocas e amenidades em detrimento dos blogs voltados para assuntos mais densos).

Nospheratt – Esse paradigma só poderá ser vencido no dia em que o ser humano mudar. Ou seja, espere sentado. Porque essa preferência não é uma coisa que vem da blogosfera, é inerente ao ser humano desde sempre (tanto que essa expressão vem de milênios atrás, e continua vigente até hoje).

O que podemos fazer é continuar trabalhando, continuar escrevendo sobre assuntos "densos", e ir captando o público que se interessa por essas coisas. Escrever de forma clara e simples ajuda a atrair ao menos uma parcela dos que consomem "pão e circo", mas não acredito que veremos o dia em que esse paradigma será quebrado.

O que nos resta é continuar fazendo nossa parte, apesar de tudo isso. Porque nossos textos podem mudar a cabeça de um punhado de pessoas, e isso funciona como pedrinhas atiradas na água; é o ponto de origem de uma mudança que se expande em círculos maiores. Não sabemos até onde esses círculos podem chegar, mas podemos jogar as pedrinhas.

 

 

Visão Panorâmica – Deixe um recado para os leitores.

Nospheratt – Façam a sua parte. Não importa se você escreve, ou lê, compartilha o que descobriu com outras pessoas, ou ensina através do exemplo; faça sempre a sua parte, sem importar quão pequena ela seja, sem importar o quanto o panorama parece negro. Quanto mais pessoas estiverem fazendo a sua parte, mais próximos estaremos das soluções que todos precisamos.

 

 

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