A costa amazônica abriga 70% dos manguezais do Brasil. Distribuídos por uma área de 9.000 km², entre os Estados do Pará e do Maranhão a vegetação forma o maior cinturão contínuo de manguezais do mundo. Essas verdadeiras florestas de mangue, com árvores que podem chegar a 30 metros de altura e um metro de diâmetro, são o refúgio de diversas espécies de crustáceos, peixes, moluscos e aves marinhas, mas ainda permanecem desconhecidas pela maioria dos brasileiros.
Manguezais têm sedimento lamacento e salino, inundado diariamente pela maré, o que exige que as árvores se adaptem para sobreviver. Nos mangues da Amazônia, as principais árvores encontradas são o mangueiro ou mangue-vermelho, o mangue-siriba, siribeira ou mangue-branco e a tinteira, tinta ou mangue-preto. Em todas essas espécies, o fruto germina ainda preso na planta-mãe, o que garante a germinação das sementes antes que atinjam o ambiente salino do sedimento.
A fauna dos mangues é rica. Entre as aves, merecem destaque a garça, o guará, com sua plumagem de um vermelho intenso, quando adulto, e diversas espécies de maçaricos. Mamíferos também visitam o mangue em busca de alimento, destacando-se o guaxinim, o tamanduá, o macaco-prego, as cuícas e os morcegos. Peixes, crustáceos e moluscos também cumprem parte de seu ciclo de vida nos mangues.
Humanos também ocupam os manguezais há tempos. Tribos pré-colombianas já usavam seus recursos, mas foi com a chegada dos europeus, experientes na exploração dos manguezais da África e da Ásia, e depois, com a chegada de escravos, que o uso desse ecossistema intensificou-se no Brasil. A extração de substâncias da casca de árvores, usadas para curtir couros e na medicina popular, e a transformação em lenha foram os principais usos dos manguezais na época.
A população atual do litoral amazônico também usa os recursos dos manguezais. Mexilhões, ostras, turus, camarões, siris e o caranguejo uçá figuram entre os animais mais explorados. Pesquisa do projeto Manejo e Dinâmica de Manguezais (Madam), desenvolvido entre 1995 e 2005 em uma cooperação entre Brasil e Alemanha, mostrou que cerca de 80% das famílias rurais da região de Bragança, no Nordeste do Pará, usam recursos diretos ou indiretos dos manguezais. Além da captura de crustáceos e moluscos, destaca-se a pesca, muitas vezes feita nos canais de marés e nos rios próximos aos mangues.
Outro recurso bastante usado é a madeira, seja para construção rural, para estacas de currais de pesca ou para a produção de carvão. Substâncias retiradas da casca dos troncos são usadas hoje para corar redes de pesca e velas dos barcos, assim como na indústria do curtume. Raízes das árvores do mangue são usadas, em forma de chá, como remédio contra a diarreia. As comunidades também extraem mel de colmeias de abelhas selvagens que frequentam as flores do mangue-siriúba. Outro recurso explorado é a lama do manguezal, usada por olarias.
Expansão urbana coloca vegetação em risco
Até o momento, os manguezais amazônicos podem ser considerados bem preservados. Porém, eles também começam a perder espaço para a crescente e desordenada expansão urbana, para o turismo e para as estradas. Outros impactos comuns resultam da extração de lama, de atividades agrícolas e de atividades industriais em áreas urbanas (como Belém e São Luiz) . O cultivo de arroz e o corte de madeira também contribuem para degradar os manguezais.
Além disso, a pesca predatória e a captura de fêmeas de crustáceos com ovos têm sido práticas constantes, levando à redução da quantidade e do tamanho desses animais nos manguezais amazônicos.
Alternativas têm sido tentadas, como a criação de Reservas Extrativistas Marinhas (Resex). Acordos de pesca também têm surtido efeito, e projetos de parceria entre setores técnicos, científicos e sociais começam a ser implantados. Porém, são necessárias medidas governamentais e sociais, como informação, discussão e aplicação das leis que proíbem a pesca ou captura de diversas espécies em períodos de reprodução. É preciso também acelerar a elaboração e implantação dos planos de manejo das reservas extrativistas já criadas. Além disso, o gerenciamento regional deve orientar o crescimento das cidades costeiras.
É preciso, acima de tudo, que governo e sociedade despertem para a realidade de que os recursos naturais são finitos e de que o uso e aproveitamento de áreas costeiras devem ser planejados, respeitando os limites humanos e ambientais. Só assim será possível garantir o espetáculo de beleza das florestas de mangue da Amazônia costeira.
Moirah Paula Machado de Menezes
Ulf Mehlig