Por Bruno Mello
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O varejo está caminhando a passos largos na direção de uma fatia crescente de mercado da indústria. Os produtos fabricados pelos próprios supermercadistas, as chamadas marcas próprias, ganham cada vez mais espaço no carrinho de compras e começam a ocupar um espaço destinado às marcas tradicionais em todos os segmentos. De acordo com o 13º Estudo de Marcas Próprias da Nielsen, os brasileiros optam cada vez mais por produtos de marca própria, tanto que o volume de vendas cresceu 25,7% de agosto do ano passado a julho deste ano, enquanto as marcas tradicionais registraram crescimento de 8,4%.
A expectativa da Presidente da Associação Brasileira de Marcas Próprias e Terceirização – Abmapro – Neide Montesano, é que este mercado cresça ainda mais, porém, sem tomar mercado das marcas tradicionais. “A marca própria não tem nenhuma intenção de bater os produtos multinacionais”, afirma. O mesmo estudo da Nielsen apontou uma ligeira queda das marcas próprias dentro do mix de produtos do varejo, o que não afetou no resultado positivo e no crescente investimento das redes nestes produtos.
O Carrefour, por exemplo, lançou em novembro uma linha com 318 itens de presentes, decorações e utensílios de cozinha. A nova marca, com preço médio 10% mais barato do que os líderes, se chama “casa&deco” e tem como posicionamento se diferenciar pelo design, vendendo presentes, móveis, aparelhos de jantar, jogos de panelas, inclusive de inox, faqueiros, utensílios de cozinha e cutelaria.
De olho nestas movimentações, o mercado já dá como certa a construção de um supermercado da rede Pão de Açúcar destinado a vender apenas marcas próprias, como a sua revigorada Taeq, que fez parceria recente com Isabela Capeto, que desenvolvera diversos produtos para a rede. “Há redes na Inglaterra que tem 70, 90 e até 100% dos produtos que são marca própria. O interessante é que lá eles já estão numa quarta fase, onde a marca própria vai buscar produtos com novas tecnologias, que às vezes nem os líderes tem”, conta Neide, que também é Presidente do comitê de marcas próprias da Abras – Associação Brasileira de Supermercados.
O mercado de marca própria vem crescendo constantemente no Brasil. Quais são os principais motivos para este crescimento?
O crescimento se deve ao fato de termos iniciado uma comunicação para o consumidor final da qualidade que temos hoje na marca. Apesar do produto sinalizar isso através da embalagem e do posicionamento no ponto de venda, isso se perde um pouco porque ele está no meio de uma gôndola junto com muitas outras marcas. Com essa comunicação, conseguimos quebrar uma idéia do passado de que a marca própria era um produto que não tinha qualidade.
Este crescimento se deve ao fato da própria evolução do setor, não é?
Tivemos a primeira fase de marca própria nos anos 1970 e aconteceu no Brasil o que aconteceu lá fora, duas décadas antes, com produtos intitulados marca branca porque sequer marca eles tinham. Não havia preocupação com qualidade e era um produto de combate. Passamos por uma segunda fase no Brasil nos anos 1990 onde os produtos começaram a ganhar marca, com uma pequena preocupação com a qualidade do produto.
Hoje chegamos numa terceira fase onde o produto tem todos os pré-requisitos de marcas tradicionais no mercado, com uma preocupação muito grande de embalagem. O fato da marca própria ter um diferencial de preço pode sinalizar que ele não tenha uma qualidade ideal, mas essa diferença no preço é fruto do enxugamento do custo porque os produtos de marca própria não têm investimento em mídia, na área de marketing e de comercial. Nesta fase, começamos a mostrar que os produtos têm marca, tem assinatura e garantia de qualidade.
Se o grande diferencial é o preço se comparado à marca tradicional, o que as marcas próprias precisam fazer para se diferenciar entre elas?
Quando falamos em marca própria ela tem como objetivo fugir da concorrência entre si. Há algum tempo ela vem se tornando uma ferramenta de fidelização. Cada varejista tem a sua estratégia de acordo com o público que atende. Partindo do principio da qualidade, é como comparar um Fusca a um Mercedes. Os dois têm qualidade de acordo com o público específico. Cada um tem valores e exigências exclusivos. Por isso não existe concorrência entre marcas próprias porque ela atende a primeira lei do varejo, que é a concorrência na gôndola.
O Grupo Pão de Açúcar criou a marca Taeq com um conceito diferente. Como a senhora vê este novo produto?
Taeq é uma marca transversal, com um conceito. O Pão de Açúcar resolveu destacar o produto em um local específico para a marca no ponto de venda. No caso do Carrefour, ele posicionou a marca própria dele junto com o líder de mercado. Então, se você for ao Carrefour, você verá o líder e logo abaixo a marca própria do Carrefour. Isso, em todas as categorias. Em outras redes, há outro posicionamento. O importante de um produto marca própria é saber qual é o posicionamento dele.
Uma pesquisa da Nielsen indicou que apenas 31% os varejistas têm marca própria. Há um mercado grande a ser explorado ainda, não tem?
Costumo dizer que o céu é o limite. Temos crescido, mas ainda temos muito para crescer. Mas para isso precisamos de indústrias com capacidade instalada para atender a marca própria em todos os segmentos, inclusive em segmentos com tecnologia avançada. Precisamos ter fornecedores que entendam que marca própria é uma unidade de negócio, não para ocupar capacidade ociosa. O segundo ponto é que, para fazer marca própria, precisa ter volume para reduzir custos. A quantidade é um gargalo, basta ver que somente as grandes redes entraram neste projeto.
Hoje o consumidor compra cada vez mais nos mercados de vizinhança e em muitos casos não há grandes redes nestes locais. Como os pequenos podem ter suas marcas próprias?
A grande pergunta é como chegar nas classes C, D e E, onde está o maior volume de compras. Mas não tem como fazer marca própria para um mercadinho porque o volume é muito pequeno e não haverá um custo competitivo. Mesmo assim, nos últimos cinco anos, vem crescendo a marca própria neste segmento porque eles se uniram, com um movimento cooperativista. Como essas redes tem até 60 mini-mercados atrelados a eles, com uma bandeira única, há possibilidade de se fazer marca própria para eles. Quando dizemos que há 5,5% de marca própria no varejo, temos que lembrar que temos atacadistas que estão muito forte neste segmento.
Como vai ficar a disputa das marcas próprias com as marcas tradicionais, da grande indústria?
Vai ficar como é lá fora. Há redes na Inglaterra que tem 70, 90 e até 100% dos produtos que são marca própria. O interessante é que lá eles já estão numa quarta fase, onde a marca própria vai buscar produtos com novas tecnologias, que às vezes nem os líderes tem.
Diante deste cenário, qual é o recado que a senhora deixa para os profissionais de marketing que estão desenvolvendo produtos que não são marcas próprias?
A marca própria não tem nenhuma intenção de bater os produtos multinacionais. Ela é mais uma marca dentro de uma categoria que vai guerrilhar no ponto de venda igual as outras. Não enxergamos que a marca própria vai ocupar o espaço das multinacionais. Não temos esta pretensão.
Como não vai ocupar o espaço das grandes marcas se o próprio Pão de Açúcar vai criar um supermercado somente com marcas próprias?
Fatalmente ele pode vir a ocupar, mas isso é natural da concorrência. Quem tiver competência se estabelece. A marca própria tem a inteligência do varejo junto com a inteligência da indústria e esta parceria vai vingar cada vez mais.
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FONTE: Mundo do Marketing