Consideradas uns dos principais instrumentos do governo para compensar a queda de arrecadação, as parcelas dos lucros das estatais repassadas ao Tesouro Nacional enfrentam uma forte pressão para cumprir esse papel. A desaceleração da economia no primeiro semestre e resultados negativos em empresas como a Petrobras, que registrou o primeiro prejuízo trimestral em dez anos, põem em dúvida a capacidade de os dividendos das estatais garantirem o equilíbrio das contas públicas em 2012.
Recentemente, o governo elevou em R$ 3 bilhões – de R$ 23,5 bilhões para R$ 26,5 bilhões – a estimativa de pagamento de dividendos de estatais em 2012. Esse dinheiro ajudará a compensar a queda de R$ 13,3 bilhões esperada na arrecadação federal de impostos em relação ao valor originalmente projetado no orçamento. Especialistas, no entanto, questionam se essa previsão é factível.
De janeiro a junho, o Tesouro Nacional recebeu R$ 7,956 bilhões em dividendos, o que significa que o governo teria de requisitar cerca de R$ 8 bilhões de lucros das estatais no segundo semestre para alcançar a estimativa. Para o economista-chefe da Corretora Convenção, Fernando Montero, isso só será possível se as estatais puderem pagar dividendos acumulados não repassados em outros anos. “Em tese, o governo tem como tirar mais resultados com base em dividendos acumulados”, disse.
Para Montero, o recente prejuízo da Petrobras e as perspectivas de diminuição do lucro do Banco do Brasil indicam que o governo deve apelar para outras empresas. “Tenho a impressão de que o grosso [dos dividendos] virá do BNDES [Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social], mas para saber se o governo conseguirá levantar todo o valor estimado, é necessário esperar os resultados das estatais”, declarou.
A política de distribuição dos dividendos é definida em assembleia de acionistas, que decide que parcela do lucro deve ser reinvestida na própria empresa e que proporção é distribuída aos acionistas. Principal acionista das estatais federais, o Tesouro Nacional pode abrir mão desses recursos em momentos de expansão da economia e exigi-los em momentos de queda na arrecadação. Esse procedimento, no entanto, foi usado em 2009 e 2010, e, segundo especialistas, não se sabe se as estatais ainda têm fôlego para repassar mais dividendos.
O economista-chefe da Sulamérica Investimentos, Newton Rosa, acredita que, em um ambiente de queda de receitas e de gastos que não diminuem, os dividendos tornaram-se essenciais para cumprir o superávit primário – economia para pagar os juros da dívida pública. Neste ano, o Governo Central, composto pelo Tesouro Nacional, pela Previdência Social e pelo Banco Central, deve economizar R$ 97 bilhões. Com a crise atual e o crescimento dos gastos públicos, ele questiona se o governo conseguirá cumprir a meta cheia.
“Estamos em um quadro excepcional, em que o mundo atravessa uma crise muito grande. Como o Brasil está em uma situação fiscal muito melhor que a maioria dos países, temos espaço para não cumprir a meta cheia este ano, desde que o governo reafirme o compromisso com a política fiscal saudável nos próximos anos”, disse Rosa.
Montero também indaga se o governo deveria requisitar mais dividendos apenas para tentar cumprir a meta de superávit primário. “Receitas extraordinárias como os dividendos ajudam a alcançar a meta, mas têm pouco impacto sobre a demanda porque não representam o que o governo, de fato, conseguiu economizar. Não sei até que ponto vale usar manobras contábeis para insistir na meta cheia”, declarou.
Edição: Aécio Amado