Certamente o senhor não me conhece como ninguém aqui. Sou o seu mais novo vizinho. Moro no 38. Mudei ontem. Eu e o Alfredo, meu cãozinho, esse produtor de esterco. Não tenho medo de me expor; sei que não é de bom alvitre ser assim, não é mesmo? Mas comigo eu me entendo. Não devo nada a ninguém. Livro aberto. É isso, a minha vida é um livro aberto. Escancarado. É que depois de algum tempo a gente adquiri o direito a todas as licenciosidades. Adoro umas biritas. Lá, de onde vim, as pessoas gostavam de me chamar de bêbedo, mas não ligava não. Quando beberico não faço mal a ninguém, a não ser a mim mesmo. As biritas que tomo ajudam a destilar as tristezas que sinto. Sim. Ando triste, senhor. Tristeza aguda. Mas isso ainda não é pecado ou é? Sinto-me um igual àquele Marmeládov, um russo que bebia para sofrer melhor, mais profundamente. É só isso. Como já lhe disse, moro no 38 e se quiser aparecer pra tomar uma birita, estamos aí.
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