A estrela banguela

Já passei por boas, viu. Uma vez, queria namorar. Angela, este era o nome dela. Pensava que a menina gostava de mim e devia gostar mesmo. Até que eu não era tão desabonitado…

Angela!

A gente era amigo. Dizia que ia me levar pra Londres, mas por que pra tão longe, meu Deus?, o meu coração perguntava. Eu morava no Castelinho. Tinha uma ponte e um rio de casas embaixo.

O Castelinho era um quartinho, todo branquinho. A Angela na janela, princesa sonhante, na casa de cima. Era de noite, as canjiquinhas dela clareavam o negrume. Londres, a cidade. Essa Angela tinha cada uma!

Eu não sabia demonstrar os meus sentimentos. A gente ali no sofá da casa dela, meus olhos nos olhos dela. Os olhos dela nos meus. Só eu e ela, de mãos atadas e o coração que não cabia dentro do peito. A mãe dela se chamava Alice, na cozinha a dona Alice tricotando; tinha um olho no gato e o outro no peixe. A mãe dela era legal.

Nesse tempo, eu era um reles – iniciante e titubeante – soprador de ventos, sem futuro. Não sabia bem o que ventar pra moça da janela, aquela princesa sonhante e sonhável. Angela, a linda Angela.

E a Angela lá, com aqueles olhinhos pidões de jabuticaba madura, exibindo as suas canjiquinhas. Eu pensava com os meus botões, enquanto a princesa falava e falava sem parar…

Brincadeira sem graça moça. Ocê fica aí falano, falano e eu escuitano, escuitano. Aí as horas passam, o ônibus passa, a minha mãe passa passando roupas, até a uva passa e ocê fica aí: falano, falano e eu fico aqui, escuitano, escuitano… Aí as horas passam, o ônibus passa, a minha mãe passa passando roupas. Até a uva passa. E ocê? Ah, ocê fica aí trem bão.

A Angela ia me levar pra Londres, um dos maiores centros financeiros do mundo. Estaria em Londres com a Angela, mas não deu tempo. Ela não tinha todo o tempo do mundo, ninguém o tem. A Angela virou estrela.

Uma estrela lá no céu, léu em léu, se vê da janela, se vê que é ela: Angela, a estrela banguela.

…