O jovem e suas relações no mercado de trabalho

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Empresas de um lado, jovens anciosos do outro. Conservas culturais, espontaneidade e criatividade, como podemos fazer isso dar certo no mundo do trabalho?

Este artigo tem como objetivo traçar um paralelo entre os conceitos da teoria moreniana que geraram a revolução criadora de Jacob Levy Moreno, a espontaneidade e criatividade para o rompimento das conservas culturais, relacionando-os com a necessidade de adequação do jovem recém ingressado no mercado de trabalho e a dificuldade de equilibrar sua espontaneidade pulsante com as conservas culturais presentes nas empresas.
Para Moreno o Homem nasce espontâneo, com recursos inatos também de criatividade e sensibilidade, sendo a espontaneidade impulsionadora para o ato criativo. Dentro do processo de existência, a teoria Moreniana afirma que a espontaneidade e criatividade estão vinculadas entre si, pois podem existir pessoas que sejam espontâneas, mas sem necessariamente terem um ato criativo, mas não há a possibilidade de existir criatividade sem antes ter existido a espontaneidade.
Apesar dos seres humanos, segundo a visão de J. L. Moreno, serem naturalmente espontâneos a partir do nascimento, nós deixamos de sê-lo devido a fatores adversos do meio ambiente, que geram comportamentos estereotipados e padrões de vida que acabam castrando a criatividade inata.
Mas, se o Homem para ser co-criador do Universo deve liberar seu fator E (espontaneidade) contribuindo com o todo a sua volta e consigo mesmo, como romper padrões pré-estabelecidos e evitar as conservas culturais recuperando a espontaneidade e criatividade?
Ainda mais significativo, é analisar a mesma questão colocando-se na situação de um jovem recém ingressado no mercado de trabalho.
As empresas são dotadas de uma cultura organizacional enraizada desde a sua origem, sendo a cultura organizacional um conjunto de valores e crenças que permeiam as relações interpessoais dentro de uma organização. Para Chiavenato (1996), “a cultura organizacional consiste em padrões explícitos e implícitos de comportamentos adquiridos e transmitidos ao longo do tempo que constituem uma característica própria de cada empresa”.
Apesar de, segundo Flávio Fortes D’Andrea (1987), cada cultura ser “resultado da criatividade dos homens que a construíram e constitui-se de um armazenamento de conservas, permanecendo como elementos cristalizados a resistir às tentativas de novas tendências criadoras”, a todo o momento existem novas tendências criadoras a fim de “descristalizar” as conservas culturais, existindo grande criatividade dentro dos limites estabelecidos. Um exemplo seriam os jovens que com suas gírias e neologismos, acabam fazendo uma revolução criadora contra a linguagem tradicional, pois a “luta contra as conservas culturais é, no dizer do próprio Moreno, uma das características básicas de nossa civilização, expressando-se nas mais diferentes tentativas de escapar de seu império. Este esforço de libertação representa simbolicamente o desejo de reencontrar o paraíso perdido, o mundo original do Homem, que gradativamente foi substituído por este mundo que temos de suportar” (D’ANDREA, 1987).
O jovem é dotado de espontaneidade e em plena formação de sua criatividade. Sua maneira de agir, de se vestir, de falar e se relacionar, tudo gira em torno da espontaneidade e criatividade com a finalidade de quebrar conservas culturais, com toda a sua experimentação de vida, sem se privar das vontades.
Mas, quando começa a viver experiências profissionais e adquirir independência, o adolescente passa por mudanças tanto físicas quanto emocionais, com questionamentos sobre si mesmo, a sociedade e seu futuro. De acordo com Lucchiari (1993), citando Içami Tiba, com a chegada da puberdade, o Núcleo do Eu (que é a fase de reconhecimento) sofre transformações corporais e do pensamento abstrato. “Então, com um novo corpo e uma nova forma de pensar, o jovem passa a ver o ambiente de maneira diversa. É quando constatamos os questionamentos dos valores (aceitos pela família e a sociedade), das instituições (família e escola), das ideologias, etc.” (LUCCHIARI, 1993).
Talvez devido a esta nova forma de pensar, o adolescente comece a questionar os padrões sociais e a bloqueá-los formando uma nova forma de se comunicar com o mundo, verbal e corporalmente.
Eu vejo o adolescente como uma criança em desenvolvimento que acaba tendo a espontaneidade criadora em nível muito mais alto que o adulto. Conforme D’Andrea (1987) afirma, hoje, o homem precisa ser estimulado a desenvolver e reencontrar a espontaneidade criadora, pois os mecanismos que governam nossa civilização disciplinam e massificam as pessoas em torno de estereótipos culturais e por este motivo a espontaneidade criadora aparece nos adultos apenas ocasionalmente, ou quando o indivíduo é obrigado a reagir de uma maneira nova frente a uma situação antiga.
Na Revista Brasileira de Psicodrama de 1999, Devanir Merengué fala sobre espontaneidade criadora: “A idéia moreniana de espontaneidade criadora é simples e complexa ao mesmo tempo. Diz respeito àquelas respostas originais, disruptivas, iniciadoras de novas formas de atitudes humanas frente à determinada ordem. Não vale qualquer resposta: deve ser dada livremente e estar articulada a uma demanda específica. Trata-se, portanto, de uma questão de vital importância se falarmos de mudança” (MERENGUÉ, 1999, pág. 65). E, em que fase de desenvolvimento do ser humano existe tanta mudança em um curto espaço de tempo, se não na adolescência.
Merengué afirma também que conserva cultural diz respeito ao produto de criação, que pode ser um estímulo positivo, gerando transformação positiva, ou um convite à acomodação, afirmando que o homem precisa de conservas culturais mais não deve apegar-se a elas.
De acordo com Moreno, o fator E é associado à adequação, à adaptação do Homem a si mesmo, sendo a espontaneidade, a capacidade de agir adequadamente em novas situações, transformando aspectos que sejam insatisfatórios.

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Será possível neste caso, o jovem ingressar no mercado de trabalho e não perder o seu senso crítico e seu potencial criativo? Se o jovem é capaz de revolucionar a linguagem, as vestimentas e consequentemente alguns padrões sociais no decorrer dos anos, com certeza será capaz de transformar rotinas administrativas e padrões organizacionais rígidos se sua contribuição for produtiva dentro da organização.
Então o jovem, pode fazer uso das conservas culturais existentes nas culturas organizacionais para transformar-se em um ser criativo, gerador de novas situações que possam contribuir com a empresa, sendo assim, contribuinte das novas culturas organizacionais, pois o Homem criativo e espontâneo de Moreno é um ser mutante.
E essa mutação pode ocorrer no processo de escolha profissional e na própria vivência de trabalho, o que em meu setting profissional torna-se totalmente visível, durante os cursos de capacitação profissional que realizo com jovens inseridos no mercado de trabalho.
Não que a conserva cultural seja um elemento negativo, visto que ela pode ser extremamente útil para o desenvolvimento de novos comportamentos positivos que auxiliem na co-criação do Universo, mesmo que este universo não seja significativamente infinito. Como Merengué expõe, não há a necessidade de vermos a conserva cultural como um elefante branco, conforme Moreno retratava em seu tempo, porque hoje, a conserva cultural é puro movimento.

Referência Bibliográfica:
CHIAVENATO, Idalberto. Os novos paradigmas: como as mudanças estão mexendo com as empresas. São Paulo: Atlas, 1996.
D’ANDREA, Flávio Fortes. Psicodrama: teorias e técnicas. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1987.
GONÇALVES, Camila Salles. Lições de psicodrama: introdução ao pensamento de J. L. Moreno. São Paulo: Ágora, 1988.
LUCCHIARI, Dulce Helena Penna S. Pensando e Vivendo a Orientação Profissional. São Paulo: Summus, 1993.
MERENGUÉ, Devanir. Sexualidade e Espontaneidade Criadora. Revista Brasileira de Psicodrama, 1999, vol. 7, nº 2, p. 65. ISSN 0104-5393.

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