“Não quero voltar para aquele inferno nunca mais”, diz jovem de 14 anos que passou um mês no Caje

Brasília – Adolescentes que passaram pelo Centro de Atendimento Juvenil Especializado (Caje), no Distrito Federal, relatam as dificuldades para esquecer os momentos de angústia e sofrimento vividos na instituição.


É o caso da cozinheira Poliana Gomes, 22 anos, que passou grande parte da gravidez no Caje, por tráfico de drogas. “Quando fui para lá, estava grávida de quatro meses. Fiquei no Caje até o dia do nascimento da minha filha, senti as dores e então me levaram para o hospital. Fui maltratada e sofri muito. Foi um momento traumático da minha vida. Tive parto normal e fiquei o tempo todo algemada”, contou, com lágrimas nos olhos.


Ela só foi liberada, pela Justiça, para voltar para casa duas semanas após o nascimento da filha. “Passar a gravidez dentro daquele lugar [Caje] não foi nada fácil: eu tinha que levantar bem cedo, tomar banho com água gelada e muitas vezes desligavam as luzes, a gente ficava no escuro.”


Ex-interno, Felipe Gomes*, 14 anos, tem más recordações sobre os dormitórios, as refeições e o tratamento que recebeu. “Lá dentro [Caje] é tudo velho, as paredes dão choque, a comida era muito ruim, não tinha bebida nenhuma, nem água filtrada, eu tinha que beber água do chuveiro. Eu fiquei no quarto com mais cinco meninos, lá tinha espaço para dois, a gente dormia amontoado, não quero voltar para aquele inferno nunca mais”, disse ele, que foi internado no Caje por tentativa de furto e roubo.


A adolescente Mônica Pereira*, 16 anos, que ficou uma semana no Caje por tráfico de drogas, disse que “não consegue esquecer” as condições inadequadas de higiene. “Lá é horrível: tudo é muito escuro e sem ventilação. Tudo é difícil dentro do Caje, até mesmo tomar banho, nem absorvente eu recebi, tive que me virar. Sem contar as vezes que a comida vinha estragada. Eles jogavam as marmitas pelas grandes, como se a gente fosse cachorro”, contou.


Os adolescentes se queixam ainda do despreparo para o retorno à sociedade, depois do período de internação. “Quando eu saí de lá fiquei sem saber o que fazer, no desespero, sem emprego e precisando de dinheiro. É difícil conseguir emprego tendo a ficha suja, o preconceito é muito grande e a realidade é cruel”, relatou Poliana Gomes. Segundo a cozinheira, o ideal durante a internação é preparar os adolescentes e tentar encaminhá-los para o mercado de trabalho.


A subsecretária do Sistema Socieducativo da Secretaria da Criança do Distrito Federal (DF), Ludmila de Ávila Pacheco, disse que as dificuldades em atender às demandas dos internos no Caje resultam da superlotação e da ausência de infraestrutura adequada.    


A Justiça do DF determinou o fechamento da unidade até março de 2011. O prazo foi prorrogado, a pedido do governo, até outubro de 2011 – prazo que também não foi cumprido. Segundo o governo do DF, após a construção das cinco unidades, o Caje será desativado. A primeira delas, entretanto, só deve ficar pronta em 2013.


*Os nomes são fictícios em cumprimento ao que determina o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA)   //    Edição: Juliana Andrade e Lílian Beraldo


Agência Brasil

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