OS CAIÇARAS E SUAS HISTÓRIAS…

Pedro Paulo Teixeira Pinto
EX-articulista@ubaweb.com

Em 1.951 fui aluno do professor Joaquim Lauro Monte Claro Neto, no Grupo Escolar “Dr. Esteves da Silva”. Vestia terno e gravata. Lembro-me do seu sempre paletó jaquetão e de sua figura austera. Dedicado, personificou uma época em que o professor e a escola pública eram vistos com grande respeito.
Bem mais tarde, em 1.976, freqüentei reuniões políticas em sua casa, ou melhor, “Consulado de Lorena”, conforme uma grande placa de madeira que encimava o portão de entrada, no caminho do Tenório. Indicava seu devotamento à sua cidade natal.
A esposa inseparável, Dona Zezé, sempre atenta nos cuidados com o professor, que todos os anos, no Itaguá liderava a realização da “Corrida de Canoas”, que no dia 14 de setembro comemora a Paz de Iperoig.
Determinado, encabeçava várias atividades comunitárias, por inteiro, e era dessas pessoas solidárias por vocação.
Dedicava boa parte de sua atenção às plantas e juntos plantamos em pé de pau-brasil na Praça 13 de Maio, num Dia da Árvore.
Na Prefeitura tive o prazer de trabalhar com Maria Joana, sua filha e assistente social, entre 1.983 e 88.
Senti estar fora da cidade quando de sua despedida, bem como da do estimado Félix José Francisco, o “seo” Félix, atento observador da cena política local. Estava sempre em sintonia com os bastidores, mesmo porque os políticos da terra assinavam ponto diário no tão falado “banco do Félix”, que ficava na calçada, em frente ao seu Bazar Luna, na Rua Dona Maria Alves.
O prefeito, vereadores, o vigário, o delegado, o diretor do grupo escolar, ali sempre paravam nem que fosse para um dedo de prosa.
À tarde, o mundo, quando chegava a Ubatuba, chegava pelos jornais de São Paulo e pelas mãos do “‘seo” Félix. Os poucos mas assíduos leitores ali se postavam para esperar as notícias. Vez em quando discussões acaloradas esquentavam o pacato bazar, sacudindo a poeira e acendendo a fogueira de paixões políticas. E lá vinha o Félix cheio de panos quentes, zeloso que era com as velhas amizades freqüentadoras de sua casa.
O Souza, o Filhinho, o Teixeira, o Silvino, o Almeida, o Rebouças, o Orlando Carneiro, eram personagens certos da “sala de leitura”. O mundo que chegava impresso, inquieto, apressado, ansioso, barulhento, progressista, cifrado, competitivo, enchia os olhos mas permanecia longe da vida que bocejava pelas esquinas, praias e cantos da província.
Corria janeiro e um dia o “banco do Félix” amanheceu pendurado nos galhos da árvore que ainda hoje ornamenta o canto da Praça da Matriz, próximo à cantina da igreja, em frente ao antigo Luna. Ao constatar aquele abuso, mãos na cintura, furioso, “seo” Félix soltou as feras: “isso é arte desses playboys de Taubaté”. Longe de pensar que fora traquinagem de seus bem jovens amigos do cotidiano caiçara, que esperamos ansiosos por aquele momento, para alimentar nossa pura, ingênua e romântica maldade, que escondeu a autoria de alguns episódios do gênero, antes e acima de tudo, pitorescamente infantis. Podia-se brincar assim!
Que o diga o Armandão, o Luiz Fernando Aranha, o Zé Enio, o Luiz Vianna, o Herbert Marques (Beto, filho do “seo” Félix), o Gregório, o Caculé, o Alfeu, o Caubi. Um dia fomos parar numa crônica de um livro do “seo” Filhinho, por conta de uma história que nos envolvia com algumas “penosas” do próprio escritor, o ilustre Washington de Oliveira.
E me vem a Serenata Sintética, de Cassiano Ricardo:
Rua torta
Lua morta
Tua porta
Revisito aquela Ubatuba e homenageio, saudoso, os dois amigos.

FONTE : UBAWEB-1997

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