Das trevas da ditadura militar, cadáveres insepultos ainda cobram seus tributos de nossa geração. São almas atormentadas que exigem justiça e reparação histórica para seus sacrifícios. Morreram pela pátria e não contra ela. São heróis que o tempo insiste em tentar apagar da memória nacional. Dos quais, o Estado se esquiva e a sociedade não quer ouvir falar. Mas eles estão lá, feito monumentos mórbidos a manchar nossa consciência política.
Qual uma lanterna para náufragos, neste negro mar de perfídias e crimes, esta semana reapareceu a história da morte em circunstâncias suspeitas do ex-presidente João Goulart. Segundo denunciou o uruguaio Mario Ronald Neira, ex-integrante do grupo paramilitar Garra 33, financiado pelo regime de seu país, ele próprio estaria envolvido na conspiração para assassinar Jango.
Pode ser que seja apenas um delírio. Mas, o antigo membro da falange fascista relatou com detalhes um episódio que sempre esteve sob a desconfiança de historiadores e ex-dirigentes dos partidos democráticos brasileiros.
Segundo pesquisas destes segmentos, apoiadas por intelectuais de outras nações do continente americano, os ex-presidentes João Goulart e Juscelino Kubitschek, além do ex-governador carioca Carlos Lacerda, teriam sido assassinados na famigerada Operação Condor. Coordenada pela CIA, agência de inteligência norte-americana, e apoiada por militares do Cone Sul, a estratégia tinha como objetivo eliminar lideranças políticas populares afastadas do poder por meio de golpes, no Brasil, no Uruguai, na Argentina e no Chile.
Temendo uma escalada democrática com forte coloração esquerdista nas Américas, alguns marginais do Departamento de Estado dos EUA urdiram uma trama para assassinar líderes que retomavam seu caminho para o governo de suas nações.
Considerada devaneio e até ridicularizada em alguns círculos por muito tempo, esta teoria volta à tona com vigor, agora. Não se pode mais esconder essa sujeira para debaixo do tapete. Não se deve mais tentar encobrir estes eventos. É preciso que os países envolvidos investiguem à exaustão este episódio macabro.
Ideal seria, inclusive, que Estados Unidos, Brasil, Uruguai, Chile e Argentina constituíssem uma força-tarefa internacional, mediada pela OEA – Organização dos Estados Americanos, para elucidar tais suspeitas. Enquanto não houver uma resposta firme quanto a essas denúncias, a própria credibilidade do instituto democrático estará comprometida nestes países.
Mais do que enterrar definitivamente seus mortos desta guerra infame, o Brasil tem que exorcizar seus pecados, purgar seus crimes políticos e limpar a memória destes combatentes democráticos, transformando-os em mártires para que não mais assombrem nossa consciência pátria.
Fonte = Diário de Cuiabá
* PAULO LEITE é jornalista e publicitário